terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Pesca Fantasma: mais um tubarão solto de redes de pesca abandonadas!

Pequeno tubarão lixa preso nas redes fantasma no Naufrágio Macau. Foto: Marcus Davis.
O naufrágio Macau está localizado no litoral do município de Aracati, localidade detentora de uma das grandes colonias de pesca do Estado. De lá todos os dias partem dezenas de embarcações de pequeno porte para a captura de seres marinhos. Esses pescadores profissionais utilizam diversos métodos para terem sucesso na sua atividade.

O primeiro método que nos vem a cabeça quando pensamos em pesca é a linha e o anzol. Outras estratégias podem ser adotadas pelos pescadores como o uso de manzuás (armadilhas que mantém o pescado vivo até que seja retirado do mar), os currais (armadilhas fixas na área entre marés que aprisionam o pescado durante a preamar para que seja depois recolhido, na baixamar), as redes de espera que são instaladas em determinado local e depois recolhidas com os peixes já mortos em sua malha. Existe ainda outra forma de pesca menos tradicional que é a caça submarina: mergulhadores submergem, escolhem o pescado e o fisgam com arpões. Essas metodologias são as mais comuns em nosso litoral

O problema é que nem sempre tradicional significa sustentável e alguns desses métodos são mais predatórios do que outros. Vamos analisar cada um deles. 

A linha e anzol apesar de ser o método mais popular de captura não é dos mais ecologicamente corretos: mesmo com o uso de iscas específicas qualquer peixe pode ser fisgado, inclusive aqueles que não são o alvo da atividade. Logicamente que os peixes não escolhidos podem ser devolvidos ao mar, mas não antes de sofrer um estresse considerável ao ser fisgado e emergido (sua bexiga natatória pode estourar durante a emersão) que pode ser fatal para a presa não selecionada. Frequentemente linhas, anzóis e chumbadas são perdidas poluindo o leito marinho.

Os manzuás ou armadilhas submersas são posicionadas em determinado local com iscas para atrair as presas que adentram na armadilha e não mais conseguem sair. O pescador retorna um ou dois dias depois e recolhe as armadilhas colhendo o resultado da pesca. Com a escolha da isca pode-se, de certa forma, selecionar as presas. No entanto, caso a boia que marca a localização da armadilha seja perdida, o manzuá pode se tornar uma armadilha fantasma e todo o pescado aprisionado perdido.

Os currais são estruturas construídas na área entre marés e que utilizam suas variações para capturar o pescado. Os peixes entram na estrutura (parecida com um labirinto) durante a maré cheia e ficam aprisionados quando a maré seca. Apesar de ser um método ecologicamente correto pois mantém as presas vivas até que estas possam ser selecionadas e devolvidas ao mar, não é um método muito seletivo pois mesmo que seja solta posteriormente, qualquer espécie pode ser capturada.

A caça submarina se for praticada com consciência, respeito pela legislação vigente e pelos seres marinhos pode ser o mais correto e seletivo método de pesca. Isto por que o mergulhador tem a oportunidade de observar e selecionar com precisão o alvo da sua atividade. No Brasil a caça submarina desportiva só pode ser praticada sem equipamentos de mergulho autônomo (ou seja, o mergulhador não pode respirar embaixo d'água), em outros países a atividade pode ser praticada com o uso de aparelhos de mergulho, mas é extremamente fiscalizada e legislações locais devem ser seguidas a risca. O problema da caça submarina no Brasil é que a grande maioria dos praticantes não tem consciência ambiental, não respeitam o defeso nem as leis que regulam a atividade e não tem respeito pela vida marinha, utilizando equipamentos de mergulho não para selecionar, mas para capturar ecossistemas inteiros.

As redes de espera são possivelmente o método mais cruel, menos seletivo e mais predatório existente. Pescadores posicionam redes imensas (muitas vezes com hum quilometro de extensão) ancoradas e marcadas com boias. Dias depois recolhem as redes e como resultado, toda e qualquer espécie pode ser capturada. Muitas vezes tartarugas e outras espécies protegidas são trazidas para superfície já mortas, afogadas. Apesar do funcionamento normal desta metodologia ser por si só predatório, o grande problema acontece quando as redes se soltam de sua ancoragem e vagam pelo oceano capturando e matando nossas preciosidades da amazônia azul. 

Neste fim de semana retornamos ao Naufrágio Macau após seis meses de inatividade neste ponto para encontrar uma triste realidade: o naufrágio estava completamente coberto por redes fantasma, como acontece todo ano no início da temporada de mergulho. Imagine você, leitor, uma estrutura com mais de cem metros de comprimento completamente tomada por pedaços de redes de pesca. As principais entradas para o naufrágio estavam bloqueadas. Os peixes que tentassem sair ou entrar seriam aprisionados e morreriam. Um pequeno tubarão lixa lutava agoniado contras as redes que o prendiam e outras espécies foram encontradas já mortas. No dia seguinte estaria morto e três dias depois estaria decomposto. Como a decomposição no mar é muito mais rápida que na superfície nos perguntamos quantas outras espécies teriam sido mortas antes da nossa chegada.

Soltamos o bebê-lixa e retiramos 80% das redes fantasmas que estavam depredando o naufrágio apenas para termos a certeza de que em breve o Macau estará novamente coberto por redes. Este é o terceiro tubarão lixa que soltamos de redes fantasma no Naufrágio Macau desde 2011. Quantos outros morreram antes da nossa chegada? 

Esperamos que esta matéria seja um alerta para as autoridades intensificarem a fiscalização e protegem melhor nosso patrimônio. 

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