sábado, 12 de novembro de 2011

Expedição ao Vapor do Paracuru

Naufrágios poucos explorados tem uma aura de mistério. O manto azul esconde os seus segredos e cabe a nós mergulhadores trazermos para superfície e dividir um pouco desses mistérios.

Praia de Paracuru, CE
Em uma expedição composta por quatro mergulhadores recreativos e um mergulhador livre, partimos para explorar o Vapor do Paracuru. Esse "navio" é há muitos anos conhecido por pescadores da praia de Paracuru e por alguns mergulhadores que décadas atrás o desmontaram para retirar seus metais de valor e tudo o mais que pudesse ser aproveitado.
Meses antes tentamos localizar este naufrágio seguindo coordenadas geográficas do livro de um conhecido pescador sub, mas não obtivemos sucesso. As coordenadas imprecisas do início da década de 90 não nos colocaram exatamente sobre o ponto e, como estávamos no fim do dia, não tivemos muito tempo para procurá-lo.

A Busca
Embarcamos em uma enseada tranquila a vista de um imenso pier da Petrobrás de onde decolava um helicóptero. Estávamos determinados a localizar o Vapor. Tínhamos duas coordenadas que indicavam sua localização, distantes cerca de cem metros uma da outra. Após o embarque navegamos cerca de 2 horas até a área de busca e lançamos uma garatéia com uma bóia entre as duas marcações assim que chegamos. A sonda indicava 18m, temperatura da água 26 graus e a cor da água não prometia mais que 10 metros de visibilidade.
Logo que jogamos a marcação uma tartaruga subiu a superfície, indicando que estávamos no local certo. No entanto, em nossa primeira expedição meses antes apesar de não termos localizado o naufrágio um enorme cardume de guarajubas amarelas passou por nós, algo que também indica a presença de grandes formações no fundo.

Padrão de Busca Circular
Optei por um mergulho solo munido de faca, computador de mergulho, bússola, uma ponny bottle (pequeno cilindro reserva),  uma carretilha e dispositivos de sinalização. Desci junto a garatéia e ao chegar a fundo preparei a carretilha pra uma busca circular. Na superfície os outros mergulhadores abordo do barco acompanhavam minhas bolhas ansiosos por alguma notícia. Expedições de exploração podem ser decepcionantes pois não encontrar o ponto ou encontrar algo que não corresponda a nossa expectativa pode ser frustrante após horas no mar.

Estiquei todo o cabo da carretilha a fim de fazer uma busca circular com raio de 50m. Marquei a posição inicial coma bússola e começei a procura-lo. Após três quartos do circulo e entendiantes 20 minutos com apenas 5 a 6 metros de visibilidade algo começou a mudar. O padrão da ondulação da areia tornou-se irregular e um pouco de cascalho se mostrou, e então... um peixe! E logo outro e outro. Com a carretilha totalmente esticada no limite da visibilidade dava pra ver uma mancha escura no horizonte. Puxei a carretilha nesta direção para arrastar a garatéia e a estrutura tomou forma. Não dava para identificar o que exatamente, apenas uma enorme massa de metálica que subia cerca de 5 metros do fundo. Amarrei a linha de busca ao naufrágio fazendo um "caminho submerso" e subi para avisar aos outros. Vibrei ao dizer "Vamos mergulhar no Vapor do Paracuru"!

Fizemos um breve intervalo onde passei um briefing de como chegar ao naufrágio e o que iriam encontrar. Nos equipamos para o mergulho em que fui o último a descer.

O Naufrágio
Mergulhador na Proa
do vapor do Paracuru
Em duplas começamos a explorar o naufrágio. Logo no início algo me chamou atenção: apesar de bem destruído era possível identificar que as chapas de aço que compunham o costado eram pregadas com rebites e não soldadas. Isso é um indício de que o navio provavelmente fora construído antes do início da década de 30, época em que o uso de rebites para juntar as chapas foram descontinuados. Cabeços de amarração estavam claramente identificados e em um deles, de menor porte e parcialmente enterrado era possível ver que metal derretido o cobria, um indício de que o navio fora submetido a fortes temperaturas, talvez um incêndio possa ter sido a causa do sinistro. Para colher informações de um naufrágio é preciso estar atento aos detalhes...

Muita vida marinha habita o naufrágio: tartarugas, arraia de fogo, cardumes de galos, xilas e sardinhas tão densos que as vezes até atrapalhava a precária visibilidade.

Estrutura da Proa
O naufrágio está bem destruído, seu costado foi "retalhado" e às vezes até é possível "se perder" das estruturas. Mas logo encontramos sua única caldeira cujo o eixo nos levavou até a popa onde estava o seu grande hélice de quatro pás ainda no lugar, cada uma dessas pás mede mais de 1,8m evidenciando o tamanho do naufrágio. Ao localizar a popa "entendi o naufrágio". Entendi que começamos o mergulho pela proa, onde havia amarrado minha carretilha no mergulho anterior. Atrás da popa, grandes estruturas metálicas permaneciam separadas do resto no navio, talvez parte de sua superestrutura. 

Seguindo a quilha central percorremos todo o naufrágio, agora com uma noção mais clara de onde estávamos mergulhando. Também foi possível estimar o tamanho do navio, cerca de 75m a 100m de comprimento. Pouquíssimas e breves penetrações são possíveis. 

A proa e a popa estão melhor preservadas
Ao voltar a proa foi possível identificar cerca de 10 "eixos com rodas" como as de antigas locomotivas, possivelmente parte da carga do navio, algumas ainda estavam cuidadosamente arrumadas no que parecia ser um compartimento de carga de vante. Por bombordo a âncora tipo almirantado permanece junto ao navio sinal de que não foi usada momentos antes do afundamento, mas com uma peculiaridade: apesar de cuidadosamente presa junto ao costado o "braço" da âncora está desalinhado com sua "haste". Algo que para acontecer exigiu muita força ou calor.

Notei também que a popa e a proa são as estruturas mais conservadas no naufrágio. Esta última esta adernada para boreste.

Um naufrágio excepcional que merece ser explorado pelos mergulhadores do Mar do Ceará!

Técnicas básicas de Busca e Recuperação podem ser aprendidas no curso Advanced Scuba Diver PADI ou em um curso completo de especialidade em Search and Recovery PADI (Busca e Recuperação) que você faz no Mar do Ceará!

Você também pode aprender mais sobre Mergulho em Naufrágios no curso de especialidade Wreck Diver PADI no Mar do Ceará!

Participaram da Expedição
Leonardo Freire - Advanced, Nitrox e Wreck Diver PADI
Alexandre Martorano - Advanced e Nitrox Diver PADI
Rodrigo Bricks - Instrutor (Profundo, Noturno, Wreck e Nitrox) PADI, EFR e Tec Diver IANTD
Marcus Davis - Instrutor (Profundo, Noturno, Search and Recovery) PADI, EFR, Supervidor CBCE
Thiago Magalhães - Advanced, Rescue Diver, PADI
Régis Freitas - Mergulhador de Apnéia


Texto
Marcus Davis


Fotos 
Alexandre Martorano

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