sexta-feira, 6 de junho de 2014

A Luta e Resistência da Comunidade do Balbino

Paula Christiny

Praia do Balbino. Fonte: http://revistalitoralleste.blogspot.com.br/
A comunidade de Balbino possui cerca de 960 moradores, abrangendo uma área de 250 hectares no litoral Leste do município de Cascavel e ao distrito de Caponga, localizada a 60 km da capital cearense. Partindo de Fortaleza, os acessos são via BR 116 e CE 040.

O Balbino é formado por mangue, praia e lagoa, formando uma das mais belas paisagens do litoral cearense. É povoada por uma comunidade de pescadores que dependem da pesca artesanal de peixes e crustáceos para o seu sustento.Além do turismo que movimenta as barracas de praia e o comércio local, outra característica da comunidade são suas expressões culturais como a dança do coco, a renda de bilros.

Pescadores do Balbino
descendentes de guerreiros negros e índios.
Fonte: http://revistalitoralleste.blogspot.com.br/
A Origem da Comunidade
Não existem registros escritos sobre origem da comunidade de Balbino. O que se tem acerca do tema é a tradição oral existente na localidade. Segundo os moradores, o surgimento está ligado à existência de um quilombo. Nas lembranças e nas histórias contadas da descendência étnica, de negros e de índios se fala de bravura, luta e resistência. Segundo essas memórias a resistência do povo do Balbino, quando viria dos índios e negros que chegaram ao local fugidos da escravidão e da Guerra do Paraguai, ou seja, foram essas lutas que tornaram seus descendentes um povo guerreiro e forte.

Pode-se perceber, segundo moradores, que a Comunidade do Balbino foi construída partir de ideais pela unidade, identidade e solidariedade. Foi naquela praia que essas pessoas geraram e ciaram seus filhos, pescando, construíram lar e de onde tiram seu sustento.

O Início da Luta
A zona costeira cearense é atingida pela valorização e do desenvolvimento do turismo de alto padrão vindo dos interesses relacionados à especulação imobiliária. A partir dos anos de 1980 a zona costeira cearense é de vez incorporada à economia global. Sendo envolvidas no quadro as comunidades litorâneas cearenses como a Prainha do Canto Verde, Flecheiras, Canoa Quebrada, Balbino, entre outras. Essa fase de ocupação do litoral é caracterizada pelo interesse de especuladores imobiliários em ocupar as terras dos pescadores.

A especulação imobiliária na da zona costeira, nesse período, está ligada a processos de modernização da região Nordeste que estabeleceram o desenvolvimento turístico como perspectiva de geração de lucro. Nessa época surge o ideal do Ceará das grandes e paradisíacas áreas litorâneas com um modelo de turismo baseado no sol e no mar. Esse modelo foi uma das bandeiras levantadas pelos governos de Tasso Jereissati (1987-1990; 1995-1998; 1999-2002) e de Ciro Gomes (1991-1994), considerados como os governos das mudanças em contraposição aos governos dos coronéis do Ceará. Rui Caminha, proprietário da Imobiliária IWA, foi a principal figura do meio imobiliário interessado nas terras do Balbino.

Os conflito sem defesa da Comunidade do Balbino começaram em 1984, intensificando-se em 1986-87, levando à organização da Comunidade a iniciar uma luta pela posse de suas terras, tendo em vista que estavam ocorrendo invasões violentas de empreendimentos imobiliários na localidade.

As terras de Balbino, oficialmente, em parte pertenciam à Marinha do Brasil e outra parte estava sendo ocupada pelos moradores, com alguns processos para conseguir legalizar a sua posse. Assim, diante da ameaça, a Comunidade se organizou politicamente e socialmente junto a entidades governamentais e não governamentais para iniciar uma luta por suas terras. Esses elementos retomam as narrativas de sua origem caraterizada pela participação de um povo guerreiro e resistente em sua constituição.

Em 21 de fevereiro de 1987 os moradores criaram a Associação de Moradores do Povoado de Balbino com o intuito de defender a natureza local, o interesse dos nativos era lutar contra os "predadores e exploradores”, ou seja, contra a especulação imobiliária. Já em 1988, com a interferência da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE) e do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (CONDEMA), foi criada em 21 de setembro de 1988, através da Lei N° 479, a Área de Proteção Ambiental de Balbino (APA). A APA de Balbino com 250 hectares compostos uma paisagem de dunas, lagos, praias, manguezal, além da fauna existente, sendo a primeira APA do Estado. A sua criação trouxe garantias de que pelo menos as terras próximas à praia não pudessem ser comercializadas, cabendo à Associação de Moradores do povoado a sua administração dessa terra, que seria dada às famílias ou aos indivíduos que necessitassem, tendo como condição para receber a terra ter nascido na localidade.

A associação de moradores.
Fonte: http://revistalitoralleste.blogspot.com.br/
Mesmo com a criação da APA, os moradores do Balbino não tiveram paz. Suas terras ainda permaneceram sofrendo com a especulação imobiliária, principalmente por parte de estrangeiros, que compram áreas do Balbino que haviam sido vendidas antes da criação da Associação de Moradores, impedindo que a mesma interferisse nessa comercialização.

Uma Nova Batalha
Em 2013, a Associação de Moradores recebeu a informação de que a Prefeitura de Cascavel, por meio de sua prefeita Francisca Ivonete Mateus Pereira, havia enviado a Câmara Municipal um Projeto de Lei (mensagem nº 099/2013 de 2 de dezembro de 2013) propondo alterações na Lei nº 1.014 de 28 de junho de 2000 que define o Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo do Município de Cascavel. O que era proposto era a redefinição das áreas e do uso da Zona Especial APA do Balbino – (ZE6), transformando a APA em uma área urbana do município de Cascavel-CE e dividindo-a em Área de Preservação Permanente (APP), Zona de Urbanização Consolidada do Balbino (ZUC01) e Zona de Interesse Turístico (ZIT). Nesta seria permitido o parcelamento do solo para implantação de Condomínio Urbanístico Sustentável.

Mesmo trazendo em seu texto aspectos como desenvolvimento socioeconômico sustentável e bem estar da população do município, o processo de criação do Projeto de Lei foi feito de maneira autoritária, sem consulta e sem diálogo com a Comunidade de Balbino.

Os moradores ficaram sabendo do projeto através de contatos, novamente se organizaram para não ser esquecido por aqueles que defendem interesses de quem visa lucrar através da exploração de homens e de mulheres, da natureza e de suas riquezas, ignorando culturas tradicionais, com propostas excludentes e segregadoras. Como seus antepassados a comunidade reuniu forças e conseguiu a retirada do Projeto de Lei. A Associação dos Moradores do Povoado de Balbino, em nome da população, produziu um documento que trazia história da comunidade e solicitando a não aprovação do projeto. Segundo o documento dos moradores não se quer evitar o turismo, mas sugerem uma proposta que vincule a conservação dos recursos naturais com o conhecimento da cultura local.

O Balbino ainda resiste aos grandes complexos turísticos.
Fonte: http://revistalitoralleste.blogspot.com.br/
A Comunidade Ensina um Novo Caminho
Como forma der não esquecer de celebrar as memórias do povo do Balbino, vem sendo realizado a “Regata Ambiental de Balbino”. Tais eventos trazem diversas atividades: lual na praia, apresentação de dança do coco, venda de culinária tradicional e adivinhações ao redor da fogueira, café da manhã coletivo, caminhada por uma trilha ecológica e brincadeiras na praia, além da regata e da sua premiação. Isso mostra que a comunidade do Balbino está em pleno processo de construção de um modelo de turismo comunitário, sustentável e responsável, que visa à inclusão direta das famílias de Balbino nas atividades turísticas.

3 comentários:

  1. Parabéns!!!!!! Essa atitude de resistência, é que fortalece, e realmente preserva o meio ambiente!!!👏🏽👏🏽👏🏽👏🏽

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  2. Infelizmente hoje a realidade é outra. A comunidade está empobrecida pela falta de investimentos públicos e até privadas. Não há geração de empregos na comunidade, não há iniciativas que repercutem numa economia solidária e ambientalmente engajada. As novas gerações se desconectam cada vez mais das raízes do lugar e o sentimento de luta e pertença aos poucos se perde. Como se trata de uma APA a tão necessária presença de organismos ambientais não é notada o que repercute em constantes agressões ao meio ambiente em áreas de dunas, sejam elas fixas, edificadas ou não. Assim como também em áreas de mangues e alagados. O mais preocupante é que tais agressões não são feitas só por veranistas, mas também por nativos. Pouco se sabe sobre a riqueza e a dinâmica ambientais do lugar. Ao ponto de, em certos períodos, dezenas e dezenas de tartaruguinhas serem encontradas perdidas pelas ruas da praia em período de desova. Mesmo sendo comunicados de tais ocorrências entidades como IBAMA e Verde-Luz, mesmo avisados, nada fizeram. Enfim.... o Balbino sobrevive ainda pela luta de poucos, a Associação está desacreditada, os jovens sem trabalho, cultura, lazer e engajamento têm passado seu tempo com o uso demasiado de bebidas alcoólicas e drogas. Lamentável!

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  3. Infelizmente hoje a realidade é outra. A comunidade está empobrecida pela falta de investimentos públicos e até privados. Não há geração de empregos na comunidade, não há iniciativas que repercutam numa economia solidária e ambientalmente engajada. As novas gerações se desconectam cada vez mais das raízes do lugar e o sentimento de luta e pertença aos poucos se perde. Como se trata de uma APA a tão necessária presença de organismos ambientais não é notada, o que repercute em constantes agressões ao meio ambiente em áreas de dunas, sejam elas fixas, edafizadas ou não, assim como em áreas de mangues e alagados. O mais preocupante é que tais agressões não são feitas só por veranistas, mas também por nativos. Outra importante questão é que pouco se sabe sobre a riqueza e a dinâmica ambientais do lugar ao ponto de, em certos períodos, dezenas e dezenas de tartaruguinhas serem encontradas perdidas pelas ruas das proximidades da praia em período de desova. Mesmo sendo comunicados de tais ocorrências entidades como IBAMA e Instituto Verde-Luz, mesmo avisados, nada fizeram. Enfim.... o Balbino sobrevive ainda pela luta de poucos, a Associação está desacreditada, os jovens e muitos adultos sem trabalho, cultura, lazer e engajamento têm passado seu tempo com o uso demasiado de bebidas alcoólicas e drogas. Lamentável!

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