Paula Christiny
HISTÓRICO
Vestígios pré-históricos mostram que há milhares de anos os homens já exploravam o mundo submarino em busca de alimento. A exploração do ambiente subaquático era limitada pela impossibilidade de se respirar dentro d’água e pela pressão que ela exerce no organismo. O desejo e a necessidade fizeram com que os homens buscassem alternativas para superar suas limitações no meio aquático. Disto surgiram equipamentos que permitiriam aumentar o tempo de imersão e a profundidade atingida.
Equipamentos individuais de mergulho já eram utilizados no século IX a.C.. Aristóteles descreveu os sinos de mergulho. Henshaw, em 1662, mostrou o sino de imersão com sistema de ventilação a fole.
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Sino de Henshaw. Fonte: www.amazondiver.com.br |
No século XIX, com o desenvolvimento de equipamentos de mergulho eficientes e uso de tubulões pneumáticos pressurizados em obras de construções de pontes e minas, foram delineados o potencial e limitações do homem no meio subaquático e pressurizado.
Em virtude das patologias relacionadas ao mergulho, tornou-se necessária a intervenção de médicos e pesquisadores. Trabalhadores de tubulões, depois de trabalhar em ambientes sob pressão e respirar ar comprimido fornecido por compressores desenvolvidos em 1837, foram diagnosticados com sintomas de “reumatismo e frio”.
Somente quase quatro décadas depois, esse fenômeno foi diagnosticado como doença descompressiva. O seu tratamento era feito com o envio dos trabalhadores afetados para o nível de pressão que eles estavam trabalhando, até que seus sintomas melhorassem. Então eles lentamente voltavam para a superfície. Tal procedimento foi realizado até o início do século XX.
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A construção da ponte do Brooklyn. Fonte: http://www.oxibarimed.com.br/ |
Marca historicamente a origem da fisiologia hiperbárica o livro do fisiologista francês Paul Bert “A Pressão Barométrica”. Esta obra cria a área médica dedicada aos estudos das alterações fisiológicas e metabólicas
do organismo exposto a pressões superiores a pressão atmosférica e sistematiza a oxigenoterapia hiperbárica, utilizando a inalação de oxigênio puro no ambiente pressurizado.
O uso terapêutico da oxigenioterapia hiperbárica ocorreu em 1937 com Behnke e Shaw, que trataram doenças descompressivas de maneira sistemática utilizando-se tabelas de descompressão. Na década de 30 as marinhas inglesa e americana iniciaram inúmeros estudos para aplicação terapêutica da oxigenioterapia hiperbárica.
NO BRASIL
O Professor Álvaro Ozório de Almeida (1882-1952), brasileiro, é considerado pioneiro mundial do uso da hiperóxia hiperbárica, tendo realizado na década de 1930 trabalhos clínicos e experimentais, sobre a aplicação da oxigenoterapia hiperbárica na gangrena gasosa e lepra lepromatosa.
Em 1932, Álvaro Ozório de Almeida instala a primeira câmara na América Latina e publica trabalhos sobre tratamentos da hanseníase, sobre os efeitos tóxicos do oxigênio, além de desenvolver em câncer e radioterapia. A partir daí, a medicina hiperbárica brasileira passou a desenvolver-se progressivamente, até que em 1995, o CFM (Conselho Federal de Medicina) publica sua regulamentação.
A MEDICINA HIPERBÁRICA
A medicina hiperbárica está subdividida em duas áreas: uma é dedicada à atividade profissional e saúde ocupacional. A outra está relacionada ao mergulho, ela trata de pessoas acometidas por doenças próprias da atividade e da prevenção desses agravos.
A oxigenoterapia hiperbárica (OHB) é uma modalidade terapêutica em que o paciente é submetido à inalação de oxigênio puro em uma pressão maior que a pressão atmosférica em geral de 2 a 3 atm. O equipamento básico da OHB é a câmera hiperbárica. Ela é basicamente um cilindro hermeticamente fechado, resistente à pressão. Sua finalidade, entre outras coisas, é o tratamento de doenças descompressivas e acidentes relacionados ao mergulho.
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Câmera Hiperbárica. Fonte: www.amazondiver.com.br |
O mecanismo fisiológico da OHB inicia-se com a inalação de oxigênio puro em ambiente hiperbárico, que proporciona o aumento do gás no corpo. O potencial terapêutico da OHB está na capacidade de absorção de alta dose de oxigênio, que pode compensar a hipóxia ( um estado de baixo teor de oxigênio nos tecidos orgânicos).
Existem limites pré-estabelecidos para a exposição à oxigenoterapia hiperbárica referentes ao nível de pressão utilizada e do período de pressão dentro da câmera, visto que podem ocorrer efeitos colaterais envolvendo determinadas regiões e órgãos do corpo. Os efeitos do aumento da OHB no organismo durante o procedimento podem corresponder a barotraumas das cavidades preenchidas como ouvido médio, seios da face e pulmão.
O MAL DESCOMPRESSIVO E SEUS TRATAMENTOS
Mesmo com os tecnológicos computadores de mergulho que fornecem ao mergulhador todas as informações necessárias para uma descida e retorno seguros, o mal descompressivo ainda assusta. Mesmo que sua incidência seja muito baixa é importante conhecê-lo, pois ainda ele é mal interpretado.
A doença descompressiva (DD) é uma condição perigosa na qual bolhas de nitrogênio se expandem no sangue e ou nos tecidos do corpo, causando lesões em diferentes graus, isso ocorre quando um mergulhador realiza uma subida muito rápida. No mergulho autônomo, o suprimento de ar comprimido provoca saturação de moléculas gasosas no organismo. Quanto mais fundo e mais tempo se permanece ali, mais gases serão absorvidos. O nitrogênio, que não é inerte, não é absorvido pelo organismo. Quando o mergulhador inicia a subida, ocorre descompressão, esse gás se torna mais solúvel e vai se dissolvendo pelos tecidos e corrente sanguínea que se encarrega de expeli-los do corpo. Porém se ocorre uma subida muito rápida a dissolução de nitrogênio ocorre de forma muito rápida, a pressão do gás diminui de forma abrupta e bolhas se formam podendo comprometer nervos, artérias, veias, vasos linfáticos e desencadear reações químicas danosas ao sangue.
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Sintoma DD. Fonte:
http://www.ohb-rio.med.br/
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Mesmo com todas as medidas de segurança tomadas, alguns fatores individuais predispõem o mergulhador à doença descompressiva, são eles: obesidade, fadiga, idade, sedentarismo, doenças pulmonares e/ou cardiológicas, ferimentos muscoesqueléticos e o uso recente de álcool. Ainda fatores naturais aumentam a chance de se ter uma DD, água gelada, trabalho pesado submerso, mar perigoso e roupas de mergulho quentes; voo após o mergulho e a ida para grandes altitudes também podem causar DD.
Os sintomas da doença descompressiva podem ser sentidos em 10 minutos após a volta à superfície até horas depois, eventualmente dias depois. Ela pode ser dividida em dois tipos: a tipo 1 é moderada, sendo caracterizada por dor isolada em juntas, vermelhidão da pele com coceira, em geral no tronco ou abdômen, ou ainda inchaço de gânglio linfático. A tipo 2, mais grave, é caracterizada por perda da sensibilidade, que pode evoluir para perda de força e até paralisia dos membros, vertigem, sintomas respiratórios e outras formas mais raras. Porém é consensual que mais importante que classificar é o tratamento imediato e adequado à condição.
EMBOLIA ARTERIAL GASOSA
É uma questão ainda polêmica, alguns pesquisadores a consideram um outro tipo de doença descompressiva. Essa condição acontece quando o mergulhador não obedece as normas de descompressão e não respira adequadamente. É causada pela ruptura de veias do interior pulmonar devido à excessiva expansão pulmonar durante a subida de um mergulho que permite que, o gás crie moléculas que vão se expandindo de acordo com a despressurização. Dependendo de onde essas moléculas se alojarem, podem causar problemas como embolia nas artérias coronárias e AVC nas artérias cerebrais.
DIFERENÇAS ENTRE DOENÇA DESCOMPRESSIVA E EMBOLIA ARTERIAL GASOSA
Na doença descompressiva é preciso ter profundidade e tempo suficientes para saturar o corpo de nitrogênio, seu início acontece em até 36 horas após o mergulho e o déficit neurológico se manifesta na medula espinhal e no cérebro. Já a embolia arterial gasosa pode ocorrer em qualquer tipo de mergulho, se manifesta imediatamente e seu déficit neurológico ocorre apenas no cérebro.
O TRATAMENTO DO MAL DESCOMPRESSIVO
Tanto na doença descompressiva quanto embolia arterial gasosa, o tratamento com oxigenoterapia hiperbárica deve ser iniciado imediatamente. Na DD é necessário a administração de oxigênio puro até poder transportá-lo para uma unidade de urgência, visando reduzir o quadro a níveis mais seguros. Também é recomendado oxigenoterapia hiperbárica o mais rápido possível e a descompressão gradual para a lenta eliminação do nitrogênio. Para a embolia arterial gasosa o rápido tratamento é fundamental e a oxigenoterapia hiperbárica também é indicada nesse procedimento. Estudos mostram que mergulhadores que passaram por recompressão em até 5 minutos tiveram uma diminuição de mortalidade de até 5%. Com o tratamento depois de 5 horas essa taxa sobe para 10%, onde mais de 50% dos que sobreviveram apresentaram sequelas.
OUTRAS DOENÇAS RELACIONADAS AO MERGULHO
Barotraumas
É a causa mais freqüente de lesões e de desqualificação para o mergulho e para o trabalho em ambientes pressurizados. São causados por obstruções à livre movimentação do ar nos espaços aéreos do organismo, particularmente nas cavidades aéreas cranianas. Podem levar à lesões graves, permanentes e incapacitantes.
Intoxicação por Gases
No mergulho profundo (mergulho saturado) e no trabalho em ambientes pressurizados, o controle da qualidade do ar respirado e de sua composição é freqüentemente feito à partir da superfície e aceita uma margem de erro muito pequena. A intoxicação ou o envenenamento dos trabalhadores devido à falhas neste controle, tem feito vítimas em todo o mundo. Os agentes causais mais comuns são o próprio oxigênio, o nitrogênio, o monóxido e o dióxido de carbono e a poluição (contaminação) dos gases “respirados” pelos mergulhadores.
Síndrome Neurológica das Altas Pressões (SNAP)
É um fenômeno atribuído tanto à um efeito direto das altas pressões hidrostáticas quanto à ventilação (respiração) do gás hélio sob altas pressões, como ocorre no mergulho à grandes profundidades. A síndrome se manifesta por sonolência, tonteira, náuseas, e tremores generalizados com descontrole dos movimentos finos, podendo evoluir para convulsões.
Osteonecrose
É uma doença degenerativa, silenciosa e incapacitante, que acomete principalmente mergulhadores de saturação ou que já tenham sofrido episódios de Doenças Descompressivas. Tem sido atribuída tanto à intoxicação por oxigênio quanto à embolias aéreas, gordurosas e até à fenômenos osmóticos. Ocorre uma destruição e necrose asséptica em áreas específicas de ossos longos dos membros e superfícies articulares, especialmente no fêmur, articulação da bacia, úmero, articulação do ombro e na tíbia, sendo necessário afastar o mergulhador definitivamente da atividade profissional quando a doença é constatada.
Apagamento
É provavelmente a causa mais freqüente de morte em mergulhadores amadores e profissionais adeptos do mergulho em apnéia (desequipado, usa-se apenas o ar contido nos pulmões). Antes de iniciar o mergulho, muitos mergulhadores têm o hábito de hiperventilar repetidamente, na perigosa ilusão de aumentar a quantidade de oxigênio no sangue e com isso prolongar o tempo de fundo. Tudo o que conseguem na verdade é diminuir a tensão parcial do gás carbônico no sangue, retardando o sinal de alerta do centro respiratório, que é o próprio CO2 quando mais elevado. Quando mergulhados, a pressão parcial do oxigênio na circulação cerebral será suficiente para manter a lucidez por algum tempo, mas a pressão parcial do CO2, excessivamente baixa devido à hiperventilação inicial, levará mais tempo para atingir o nível necessário para "acordar" o centro respiratório e provocar nos mergulhadores a necessidade de respirar outra vez. Enquanto isso suas reservas de oxigênio no sangue terão sido consumidas e quando eles iniciarem a subida, não terão oxigênio suficiente para atingir acordados a superfície.
COMO SE PREVENIR
No mundo submerso é assim, parafraseando Fidel Castro, “entrar é fácil, sair é que é pior”. Na maioria dos casos, você não tem a chance de subir e pedir ajuda. Esteja ciente que problemas no fundo devem ser resolvidos por lá mesmo. Seja um mergulhador consciente, siga as regras, evite fatores de risco, aja com prudência. Faça uma subida lenta e gradual, lembre-se da parada de segurança, siga a sua tabela ou computador de mergulho.
Fontes:
http://www.oxibarimed.com.br
http://www.ohb-rio.med.br
http://www.feridologo.com.br
www.planetamergulho.com.br
www.revistamergulho.com.br